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Genoma da abelha sequenciado

26 outubro, 2006

A abelha Apis mellifera é o terceiro inseto a ter seu genoma completo seqüenciado. O trabalho, feito por um consórcio internacional formado por dezenas de pesquisadores, está descrito na edição de 26 de outubro da revista Nature.

Cientistas brasileiros tiveram participação fundamental no trabalho, tendo sido responsáveis por fazer do país o segundo principal contribuidor para o banco de dados que reúne as seqüências do genoma do inseto. “Ficamos com a parte de diferenciação, porque já estudávamos esse tema há 20 anos”, disse Zilá Luz Paulino Simões, professora do Departamento de Biologia da USP em Ribeirão Preto, à Agência FAPESP.

“Os norte-americanos ficaram com os genes da resposta imune de abelhas. O grupo da Austrália estudou grupos de genes neuropeptídeos e os alemães os genes determinadores do sexo”, destacou Zilá. Pesquisadores de diversos outros países, como França, Japão, Bélgica, Dinamarca e Suíça, também fizeram parte do trabalho feito pelo Consórcio de Seqüenciamento do Genoma da Abelha.

“Estudamos os eventos de diferenciação das abelhas em rainha e operária. Já se havia seqüenciado a Drosophila e o Anopheles mas, sob certos aspectos, a abelha é bem mais complexa. Ela é um animal altamente social”, disse Zilá.

O trabalho feito em Ribeirão Preto contou com apoio da FAPESP na modalidade Projeto Temático, em projeto coordenado pela professora Zilá. A participação brasileira no seqüenciamento, creditada no artigo na Nature, também contou com Klaus Hartfelder, Francis de Morais Franco Nunes, Márcia Gentile Biondi e Carlos Henrique Lobo, da USP em Ribeirão Preto, e com Alexandre Cristiano, do Instituto de Matemática e Estatística da USP, em São Paulo.

Entre as descobertas feitas a partir do seqüenciamento, os pesquisadores destacam a evolução genômica mais lenta da abelha em relação à mosca-das-frutas e ao mosquito da malária. Outro ponto importante é que o genoma da A. mellifera apresenta maiores semelhanças com o de vertebrados do que os outros dois insetos, que não formam colônias.

Zilá conta que, no artigo agora publicado, está identificada a presença de genes ligados à aprendizagem. “A pesquisa tambem abriu uma nova possibilidade científica pelo fato de termos um genoma no mínimo bivalente: a direção do desenvolvimento pode ser para rainha ou operária. Abre-se uma possibilidade de estudos de regiões (do genoma) promotoras de diferenciais”, disse.


Organização social

As abelhas são insetos sociais. Vivem organizadas em colônias nas quais os indivíduos se dividem em castas e contam com funções bem definidas. As tarefas têm sempre como objetivo a sobrevivência e manutenção do enxame.

A Apis mellifera é encontrada em grande parte do mundo e possui diversas raças, como a abelha africanizada, encontrada no Brasil. Essa é resultado do cruzamento de matrizes de abelhas africanas (Apis mellifera scutellata), trazidas para o país na década de 1950, com a espécie européia Apis mellifera mellifera, introduzida por aqui no século 19. A espécie resultante mostrou rápida adaptação e se expandiu pelas Américas.

Grande fornecedora de mel, cera e própolis, a abelha africanizada tem hábitat bastante diversificado, que inclui florestas tropicais, regiões litorâneas e montanhosas. A espécie tem grande facilidade de formar enxames, alta produtividade, tolerância a doenças e também se adapta a climas mais frios.

“A abelha é um animal muito especial. Não temos cálculos para o Brasil sobre qual fatia de ganho em produção agrícola é dependente da ação desse inseto. Mas há estudos internacionais que mostram uma dependência importante, inclusive em cultivares. Um grupo do Arizona, por exemplo, já selecionou linhagem polinizadora”, explica Zilá.

“Poderemos, no futuro, fazer melhorar uma linhagem dessas para aumentar a polinização e trazer ganhos para a produção agrícola. A abelha pode trazer mais divisas para o Brasil, que já exporta mel de alta qualidade, livre de resíduos químicos e defensivos agrícolas”, disse a professora da USP em Ribeirão Preto.


Poço mágico

Em comentário na mesma edição da Nature, Edward Wilson, do Museu de Zoologia Comparativa da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, destaca a importância do seqüenciamento ao considerar as reuniões seletivas das espécies de insetos sociais, como a Apis mellifera, um dos maiores pilares da evolução, ao lado da própria humanidade.

“As profundas mudanças biológicas que levaram a abelha produtora de mel a um estado avançado de organização social estão refletidas nesse genoma. As espécies podem, a partir de agora, ser estudadas em sua totalidade, do nível molecular à colônia”, disse.

Wilson destacou o fascínio que as abelhas despertavam no austríaco Karl Ritter von Frisch (1886-1982), ao citar a admiração expressa pelos insetos por parte do ganhador do Nobel de Medicina e Fisiologia em 1973. “A vida das abelhas é como um poço mágico. Quanto mais se extrai dali, mais há para extrair”, disse von Frisch.

Fontes:

Honey Bee Genome Project

Agência FAPESP

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